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Retração do e-commerce levanta discussão sobre modalidade ter alcançado seu platô

19/08/2022

A primeira retração dos números do comércio eletrônico desde o boom do setor na pandemia levanta uma questão: as vendas online chegaram a um platô de representatividade no varejo nacional ou a queda está relacionada a alguma questão meramente conjuntural? Pouco mais de 15 dias depois do retorno da edição presencial do Fórum E-Commerce Brasil, convidamos o especialista em
varejo e conselheiro da assessoria Hand, Marcos Andrade, a refletir sobre os diversos temas que cercam a desaceleração da modalidade no país.

No bate-papo, Andrade apontou que o momento de ‘crescimento automático’ dos mais diversos portes de varejos que se dispõem a vender online pode ter chegado ao fim e que, com isso, o momento é de potencializar velhas ferramentas como o relacionamento personalizado com o cliente. Embora tenha apontado questões como as dificuldades para oferecer o frete grátis como obstáculos adicionais ao comércio eletrônico em relação ao físico, o especialista projetou que ainda há margem para crescimento do e-commerce no Brasil. “O pequeno varejo, embora tenha muitos marketplaces disponíveis, ainda não participa deste universo digital em boa medida (…). Em razão disso, acredito que o comércio eletrônico ainda vai crescer bastante”.

Novo Varejo – O Fórum E-Commerce Brasil 2022 foi marcado pelo público recorde de 18 mil pessoas e um clima repleto de otimismo. O setor, porém, acaba de registrar sua primeira queda robusta desde a chegada da pandemia, com retração de 3,2% no segundo trimestre de 2022 no comparativo com o mesmo período do ano passado. De que lado você está nessa história: dos otimistas ou daqueles que acreditam que o comércio eletrônico pode ter alcançado o seu teto no varejo brasileiro?
Marcos Andrade 
– Te falar qual vai ser o platô, eu não vou especular. Costumo brincar sobre isso dizendo que, se alguém te der um número, você aproveita e pede os da loteria, pois é adivinhação. Analisando potencial, porém, eu vejo que a representatividade do e-commerce no faturamento total do varejo ainda deve crescer. Afinal, a gente tem um setor varejista que ainda precisa caminhar muito rumo à digitalização. O pequeno varejo, embora haja muitos marketplaces disponíveis, não participa deste universo digital em boa medida. Eu viajo muito, temos filial no México, na Colômbia… E em toda a
América Latina temos um cenário parecido: varejos que são grandes cases e podem estar tranquilamente na 5ª Avenida de Nova Iorque; e lojas que são muito amadoras. Em razão disso, acredito que o comércio eletrônico ainda vai crescer bastante.

NV – Sendo assim, a que você atribui essa primeira queda do e-commerce desde o ‘boom’ ocorrido na pandemia? Gostaria que você considerasse na sua resposta o fato da retração relativa das vendas no digital do segundo trimestre no comparativo anual ter sido mais acentuada do que as do varejo como um todo.
MA – 
Primeiro, temos de considerar a conjuntura altamente desfavorável. Aqui no Brasil, a gente tem inflação, endividamento, encarecimento do parcelamento com o aumento dos juros e todos estes custos. Quando falamos de e-commerce, isso tudo acaba sendo combinado com um agravante importante: o aumento significativo das dificuldades para conceder frete grátis, o que desestimula bastante o consumo online. Vejo como uma situação conjuntural. Mas é inegável que o segmento vem sofrendo, e sofrendo bastante. Hoje, a previsão para o crescimento do e-commerce neste ano gira em torno dos 5%. Uma coisa impensável ante as perspectivas que a gente tinha. A crença era de que o comércio eletrônico iria seguir crescendo indefinidamente e não vem sendo assim.

NV – As demissões nas empresas de logística são reflexo deste mau momento do comércio eletrônico? Pior do que isso, elas refletem um pessimismo quanto à expectativa de retomada?

MA – Sim, isso vem ocorrendo e é natural que ocorra. Há poucos meses, o setor vinha em um crescimento enorme, de situações em que havia fila nas lojas de motocicletas motivadas por motoboys em busca de oportunidade para trabalhar na entrega de produtos. Essas empresas de logística estavam se preparando para dar conta da demanda de seus clientes. Aí, quando a demanda não vem, você tem de ajustar para se manter eficiente. É isso que a gente está observando. A última a ter de recorrer a cortes foi a Loggi, que demitiu 15% dos funcionários, cerca de 500 trabalhadores. O que preocupa é que essa é uma empresa capitalizada, com planejamento. Imagina as outras
empresas, menores e sem este capital… Essas talvez nem tenham tido demissão porque não têm mais funcionários.

NV – Gostaria de voltar ao início da nossa conversa para discutir o futuro do comércio eletrônico diante deste momento de aparente consolidação e desaceleração do crescimento. Você mencionou os marketplaces como
oportunidades de digitalização para o pequeno. Hoje, com o dinheiro do consumidor mais escasso, ele ainda é uma oportunidade viável?

MA – Eu sou da seguinte mentalidade: pior do que não fazer o movimento ideal, é ficar parado. Portanto, se só é possível iniciar uma operação de venda digital a partir do marketplace, que seja assim. Sabemos, porém, que os pequenos negócios tendem a perder suas vantagens competitivas quando operam em um ambiente assim. É preciso pensar estrategicamente e saber: quando faço uma venda no marketplace, os dados do cliente são meus ou são da plataforma? Esse é um ponto crucial, pois o pequeno varejo precisa se valer de sua capacidade de criar relacionamento com seus clientes.

NV – E por que o relacionamento é tão importante assim para o pequeno varejista? Isso faz com que sua sobrevivência a médio e longo prazo esteja atrelada à adoção de CRMs e outros mecanismos de fidelização?

MA – Eu costumo brincar que o primeiro CRM é o caderninho de fiado. Esse varejista sabia todo o comportamento de consumo do seu cliente, oferecia produtos de acordo com esse conhecimento e etc. Esse é o relacionamento. Se você não entrega isso, o cliente vai buscar na Shopper, no delivery do Pão de Açúcar… Então, é fundamental ser lembrado, usando WhatsApp, que seja.
Vender pelo WhatsApp, entregar de bicicleta… Enfim, encontrar alternativas. Ou grande vai cooptar este cliente. A boa notícia é que essas facilidades estão disponíveis. Mas é preciso usá-las, pois as grandes redes estão estudando formas de replicar este relacionamento personalizado em grande escala.

NV – Nesta linha de ‘CRM quase improvisado’, apartado deste mercado das soluções mais avançadas, que dica você daria para uma loja de autopeças na hora de construir ou fortalecer uma base de clientes fidelizada a fim de se resguardar do avanço dos grandes marketplaces e até mesmo das grandes redes?

MA – A dica é: conheça seu cliente. Se eu te perguntar, qual é o principal cliente de uma loja de autopeças, você pode dizer que é o mecânico. Mas, imagino eu, que em determinada região de uma determinada cidade, o principal cliente pode ser o consumidor final, o dono do carro. Ovarejista precisa saber estes detalhes para oferecer valor para além do produto. Para mecânicos, é possível oferecer dicas de fabricantes no WhatsApp, manter esse público aquecido. Estratégia semelhante, com outra abordagem, pode ser ofertada para o dono do veículo. O importante é saber com quem você quer falar e manter este canal aberto pelos meios possíveis.

Fonte: Novo Varejo

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