Os avanços da Reforma Trabalhista de 2017 nas áreas Jurídica e Econômica foram tema de um webinário promovido pela Fundação Getulio Vargas (FGV), com apoio da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), da Confederação Nacional do Comércio de Bens e Serviços e Turismo (CNC) e da Confederação Nacional da Indústria (CNI), na última terça-feira (19), com a presença de autoridades públicas, juristas e acadêmicos. O encontro foi mediado por José Pastore, presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Entidade. Confira os destaques a seguir.
Segurança jurídica e seus reflexos
Para Ives Gandra Martins filho, jurista e ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), após cinco anos da implementação da reforma, as relações de trabalho já encontram um ambiente de mais segurança jurídica a empregadores e trabalhadores, sobretudo em relação à “espinha dorsal” da reforma: a negociação coletiva. “A reforma prestigiou esta modalidade de negociação. Fez com que o Estado fosse se retirando aos poucos da composição dos conflitos coletivos laborais, para que as próprias partes pudessem dizer quais são as melhores condições”, pontuou.
Em contraponto às frequentes ameaças que a reforma vem sofrendo, Gandra filho lembrou que, antes, o País vivia em um ambiente com uma Justiça do Trabalho que lançava o “manto” da indisponibilidade para quase tudo o que era direito trabalhista, quando a própria Constituição dizia o contrário. “Se os principais direitos, a jornada e o salário, eram passíveis de mudanças pela Carta Maior, todos os outros decorrentes deles também são. O pilar da reforma foi estabelecer regras claras.”
Ele também esclareceu sobre o tema 1.046, de repercussão geral no Supremo Tribunal Federal (STF), que está travando a pauta dos tribunais em relação à negociação coletiva. O tema diz respeito aos parâmetros e limites da autonomia deste tipo de negociação sobre direitos não assegurados na Constituição. “O tema 1.046 diz respeito aos acordos e às negociações coletivas anteriores à reforma de 2017. Como agora temos regras claras, o que foi resolvido com a reforma pode dar uma sinalização aos ministros do Supremo de que não é preciso ir muito além [do que a reforma já estabelece].”
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Eficiência no mercado de trabalho
Fernando Holanda Barbosa Filho, economista da FGV, destacou que, com o crescimento das cadeias globais de produção, tornou-se obsoleta a separação entre atividade-meio e atividade-fim, de forma que a terceirização é o que torna as empresas brasileiras competitivas. Diante do risco de revogação da modalidade da maneira como está atualmente, o que se pode ter como resultado é uma queda na competitividade da economia.
Barbosa Filho ainda ressaltou que a geração de empregos esperada após a reforma de fato não ocorreu, mas em razão das condições econômicas presentes. “Mesmo com a reforma de 2017, ainda não temos uma economia que funcione de forma normalizada. Não voltamos a crescer em um ritmo razoável, e o que gera emprego é crescimento econômico. O que a mudança na legislação fez foi reduzir custos relativos à formalização, a informalidade é um problema que está conosco há muito tempo e do qual é muito difícil se livrar.”
José Marcio Camargo, economista e professor da PUC-Rio,comentou que, quando se vê a reação do mercado de trabalho à crise ocasionada pela pandemia, percebe-se um enorme aumento na taxa de desemprego (para cerca de 14,9%), mas também a geração de quase 10 milhões de vagas em 2021, de forma que o rendimento também começa a se recuperar. “A taxa caiu, em um ano, de 14,9% para 11%; é uma queda substancial e a maior que tivemos na série histórica, considerando o período de tempo. Avalio que foi a flexibilização a partir da reforma que permitiu essa recuperação, em comparação a outros períodos de crise com mais rigidez [nas regras trabalhistas].”
No caminho contrário das críticas cada vez mais frequentes de que a Reforma Trabalhista foi ruim para a força laboral, André Portela, economista da FGV, explicou como a mudança foi fundamental para que o trabalhador tivesse toda uma estrutura de incentivos às suas metas de vida e presença no mercado: a reforma protege o empregado em situações arbitrárias por parte do empregador, contra as falhas no mercado, contra a incerteza se haverá empregos (ou não) e contra a perda de renda, além das questões de saúde no ambiente de trabalho.
Portela ainda citou três mudanças da reforma que melhoraram o mercado de trabalho brasileiro: a negociação prevalecer sobre a legislação; a terceirização ampla; e as novas modalidades de contratações. “Quando a negociação de jornada e salário é muito rígida, os empregadores ficam com poucas opções de saída durante qualquer choque negativo na economia, a não ser demitir o empregado. Se o ajuste é permitido, isso reduz o custo das empresas e beneficia a garantia do emprego. As flexibilizações são importantes para dar margem de negociação que acomodem as exigências do momento. A gente imagina que estes ganhos entre as partes individualmente são coisas pequenas, mas pense em milhões de trabalhadores e com recorrência diária. Imagine o ganho de eficiência no mercado de trabalho”, frisou.
Outros pontos levantados pelos participantes do debate foram a necessidade de se avançar na regulamentação do trabalho por aplicativo e a informalidade, que há décadas abrange grande parte da força laboral nacional. “Temos dificuldade em enquadrar esta modalidade [aplicativos], mas já contamos com mecanismos necessários. Precisamos pensar em algum fundo para compensação de renda, ou enquadrar estes trabalhadores como Microempreendedores Individuais (MEIs) – que já têm acesso à previdência –, mas sem necessariamente criar um vínculo, por exemplo”, afirmou Barbosa Filho.
Responsabilização das partes nas ações trabalhistas
Do ponto de vista processual na Justiça do Trabalho, Rodrigo Dias da Fonseca, juiz do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de Goiás, argumentou que tem sido de extrema importância a norma que conferiu maior responsabilização das partes no ajuizamento de ações trabalhistas. Contudo, ele teme que o País volte ao quase “vale-tudo” visto antes da reforma. “Em primeiro grau, já detecto os efeitos de uma decisão recente de Ação Direta de Inconstitucionalidade [766] pelo STF. Já se percebe que, na prática, não há mais risco no ajuizamento de ações trabalhistas, e pedidos ‘abusivos’ começam a aflorar novamente. Esta decisão retira da reforma uma de suas mais valiosas consequências: a racionalização das ações.”
José Pastore reforçou que o mecanismo de responsabilização é uma forma de se garantir mais respeito aos magistrados, que tinham de lidar constantemente com pedidos na Justiça do Trabalho sem procedência. “É um desrespeito o magistrado ter de mobilizar sua assessoria para julgar cada ação deste tipo. A medida foi um tributo ao magistrado”, destacou. “A liberdade [processual] precisa andar junto da responsabilidade.”
Neste mesmo ponto, Otavio Calvet, juiz do TRT do Rio de Janeiro, comentou outro importante fator de responsabilização trazido pela reforma: a indicação dos valores nas ações trabalhistas. “A atribuição do valor, em si, já é uma atribuição de responsabilidade. Não se pode mais simplesmente fazer um pedido genérico para ‘ver no que vai dar lá na frente’. Isso era muito comum antes da reforma, pedia-se a proposta de acordo para o autor da ação, e ele não sabia dizer, o que inviabilizava a proposta. Qual era a ideia de responsabilidade em cima disso?”, questionou.
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Fonte: FecomercioSP