É mais do que sabido que o varejo brasileiro depende de emprego, renda e confiança do consumidor para ter bom desempenho.
Nenhum desses três indicadores, pelo que se vê até agora, deve ser positivo em 2022, a ponto de resultar em uma retomada da economia.
Devido a este momento tão desfavorável ao consumo, lojistas devem ser cautelosos com os investimentos e aprimorar o atendimento e a gestão.
“Não é hora de jogar muito dinheiro na operação”, afirma Maurício Morgado, professor da FGV especializado em varejo e serviços.
Isso não quer dizer, diz ele, que quem tem loja tem de ficar parado atrás do balcão esperando a economia retomar e o cliente voltar.
“É o momento de melhorar o atendimento, incorporar sistemas de eficiência na operação, ter uma presença digital um pouco maior.”
Veja abaixo os principais trechos da entrevista com Maurício Morgado, consultor com mais de 30 anos de experiência em varejo e serviços.
2022 promete ser um ano ainda mais desafiador para o varejo. Desemprego, inflação e juros em alta, eleições. Quais são os desafios para as lojas?
O que determina o desempenho do varejo é emprego, renda e confiança do consumidor, indicadores que, pelo menos até o momento, não dão grandes esperanças para os lojistas.
Agora, qual será o pacote de bondades que o governo soltará por conta das eleições?
De janeiro a outubro é um bom tempo para dar uma melhorada na economia, e existe a expectativa de que a covid-19 não tenha essas complicações todas nos próximos meses. Vamos aguardar.
Mas, diante de tantas incertezas, o varejista deve se preparar para enfrentar esses novos tempos com um pé atrás, sem investir demais nas operações e, ao mesmo tempo, sem se descuidar do atendimento.
Não é o momento de abrir novas lojas, e, sim, de melhorar o atendimento ao cliente, incorporar sistemas de eficiência na operação.
Eventualmente, entrar em operações de e-commerce, ter uma presença digital um pouco maior.
Muito se fala em experiência de compra como forma de levar o consumidor para a loja física. Quais seriam as melhores experiências que os lojistas poderiam dar para o consumidor neste ano?
Entendo que ainda o velho e bom atendimento, uma loja bem arrumada, organizada, com estoque completo, são experiências importantes para os clientes que não são caras de serem realizadas.
O atendimento precisa estar adequado ao perfil do consumidor que frequenta a loja, e o olhar do dono é muito importante para isso.
O e-commerce virou quase lei no mundo do varejo. Como o lojista pode sobreviver sem a venda on-line? Quais são as opções que ele tem?
Realmente, o e-commerce virou lei porque o consumidor quer essa facilidade. Agora, para alguns setores faz mais sentido do que para outros.
A operação de e-commerce de supermercado é complexa para o supermercadista e para o consumidor.
Parece mais prático, neste caso, ir até a loja física e buscar o que precisa. No caso de outros setores, como o de vestuário, faz sentido uma presença digital mínima para que o consumidor possa visualizar modelos, estoque, tamanhos. No caso de eletrônicos, nem se fala.
É uma forma de venda que todos os setores devem trabalhar, mesmo em escala não tão profissional.
O lojista pode iniciar uma operação de vendas por Instagram, WhatsApp, oferecer alternativas para que os clientes fiquem contentes, interessados.
E a loja ainda consegue passar uma imagem de modernidade, mesmo que não possua uma mega operação on-line.
Outra alternativa é pagar mais e participar de sites, portais, plataformas já existentes, como Magalu, Amazon, Americanas, para começar a testar novos modelos de vendas.
Uma gigante do varejo, a Lojas Cem, entende que o e-commerce é apenas um complemento de venda e que apostar todas as fichas nesta forma de venda é um erro. Você concorda com isso?
Acredito que não dá para ter esta posição durante muito tempo, especialmente no ramo que a rede atua.
A empresa deve ter mais uns cinco anos de sobrevida sem entrar no mundo do e-commerce, ainda mais vendendo itens de comparação de preços muito grande.
O discurso é bacana, dá reportagens boas, mas, do ponto de vista de futuro, não vejo um futuro brilhante ficando fora da venda on-line.
Nos Estados Unidos houve uma revolução na forma de comprar nos últimos anos. É uma tendência?
Uma revolução na forma de comprar se deu nos EUA e também no Brasil.
A forma de comprar eletrônicos, livros, vestuário, medicamentos, é muito mais fácil hoje no on-line.
Agora, quando pensamos em lojas de conveniência, como as dollar stores, nos EUA, e mesmo em supermercados, que vendem produtos frescos, entendo que o e-commerce não seja tão fácil de ser feito.
Afinal, o consumidor não está disposto a esperar horas para receber em casa alimentos frescos ou até mesmo o jantar.
É preciso estudar bem cada ramo de atividade e isso vale para os EUA e para o Brasil.
Alguns supermercados nos EUA estão reunindo loja e bar/restaurante num mesmo espaço. Esta pode ser uma tendência por aqui?
Sim, é uma tendência por conta da conveniência. Há supermercados com choperia, mini praça de alimentação, comida pronta para levar.
Os lares estão cada vez menores e os clientes querem facilidades.
Essa questão de conveniência está vindo com bastante força no varejo, e o que muda agora é a conveniência com saudabilidade.
Talvez este movimento seja herança da pandemia, pois as pessoas tiveram de comer mais em casa e começaram a se preocupar mais com a saúde.
Além do fato de não terem tempo para cozinhar.
A NRF, que acontece neste mês em Nova York, sempre levanta um tema que se torna marcante no evento. Neste ano, qual deve ser o tom?
Não há como escapar, o pós-covid vai ser um assunto muito discutido, assim como logística e obtenção e manipulação de dados de clientes.
Metaverso é outro tema que deve ser debatido e, de novo, vai aparecer discussões sobre a integração do on-line e do off-line.
Quais são as novidades no mundo do varejo para este ano?
As novidades são meios de pagamento, carteiras virtuais, que são chatas de administrar pelos consumidores, mas redes já estão oferecendo.
O metaverso é algo novo que precisamos ainda acompanhar. Sinceramente, a não ser que seja uma experiência totalmente imersiva, não acredito que o consumidor vai embarcar nessa com vontade.
É a mesma história das lojas de transmissões on-line para vendas.
Precisa ser muito interessante para o consumidor sair comprando nos live commerces da vida.
Vai ter de ter muita tecnologia embarcada, óculos, realidade virtual para essa experiencia se transformar em algo minimamente comparável com as compras em lojas físicas.
Fonte: Diário do Comércio – IMAGEM: Divulgação