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Lei de afastamento das gestantes vai na contramão das convenções internacionais

04/04/2022

Por Ivo Dall’Aqua Júnior*

Em maio do ano passado, quando as incertezas sobre os rumos da pandemia ainda eram muitas, o Executivo federal sancionou a Lei 14.151/21, dispondo sobre o afastamento das gestantes das atividades de trabalho presencial enquanto durasse a situação emergencial. A despeito de conter apenas dois artigos, apresentava uma quantidade desproporcional de dúvidas e insegurança jurídica, trazendo muito mais problemas do que soluções e refletindo uma norma aprovada às pressas, sem nenhuma reflexão sobre a questão.

A origem da nova lei era um Projeto de Lei (PL 3932/2020) que, da mesma forma que o texto sancionado, se preocupava apenas com os fins, sem atentar, o mínimo que fosse, para a viabilidade e os meios para a sua implementação. O problema começava pelo prazo do afastamento. Segundo a lei, a empregada deveria permanecer afastada enquanto durasse o estado emergencial – que, como sabemos, não tem data para terminar. Outra questão dizia respeito à ausência de previsão em relação aos casos de a trabalhadora afastada não poder continuar exercendo, a distância, as funções que executava presencialmente, o que acontece na maioria das vezes, sobretudo no comércio.

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Por fim, e talvez o mais grave, nestes casos o texto legal não dava nenhuma alternativa ao empregador, que teria de continuar pagando o salário mesmo sem o serviço prestado, em total violação ao princípio da reciprocidade que rege este instituto. Aliás, na prática, esta discussão assume dimensões ainda maiores, pois além de ser obrigada a manter a remuneração dessas empregadas, a empresa deve contratar outros profissionais para substituí-las, gerando um enorme dispêndio, situação agravada pela crise econômica decorrente da própria pandemia.

A Lei 14.311/22, recém-promulgada, era a oportunidade que o Executivo federal tinha para corrigir a rota deste “voo cego”, mas não o fez. O PL 2058/21, de autoria do deputado Tiago Dimas (Solidariedade-TO), com a redação dada pelo substitutivo da deputada Paula Belmonte (Cidadania-DF), da qual se originou, procurava corrigir as lacunas e falhas da lei anterior, sobretudo o ponto relacionado ao pagamento dos salários para as trabalhadoras que não pudessem exercer o trabalho presencial a distância. A solução, aliás, que já estava dada na própria legislação em vigor, se refere à concessão do salário-maternidade.

A legislação previdenciária (Lei 8.213/91) dispõe que este benefício é devido “observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade”. Ora, parece-nos fora de dúvida que a nova lei, prevendo o afastamento da empregada gestante, se enquadra, inequivocamente, como sendo uma legislação de proteção à maternidade. Se um atestado médico já pode legalmente determinar esse afastamento, o que dizer desta determinação com origem em lei.

No entanto, o Executivo optou por vetar esta disposição, transferindo às empresas, uma vez mais, uma conta que não é delas. Esta postura, aliás, vai na contramão do que dispõe a Convenção 103, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), de 1952, ratificada pelo Brasil – a qual, em um de seus dispositivos, determina que “em hipótese alguma, deve o empregador ser tido como pessoalmente responsável pelo custo das prestações devidas às mulheres que ele emprega”.

A esperança, agora, é que o Congresso derrube o veto, como medida de bom senso e, sobretudo, de justiça – o que faltou ao Executivo.

*Ivo Dall’Aqua Júnior é vice-presidente da FecomercioSP e presidente do Comitê Trabalhista Sindical.
Artigo originalmente publicado no portal Jota em 4 de abril de 2022.

Fonte: FecomercioSP

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