Do ponto de vista internacional é impressionante o aumento do interesse no uso de hidrogênio na mobilidade. O comentário é de Ricardo Abreu, profissional da Bright Consulting, explicando que seja para o uso direto em motores de combustão, células a combustível ou na produção de e-fuels essa alternativa está em alta: “Na minha opinião isso faz todo sentido, pois o futuro da mobilidade, eletrificada ou não, depende de energia de baixo carbono que não precise de grandes baterias para ser armazenada e transportada”, disse a Automotive Business.
Ele completa o raciocínio explicando que existem várias atividades com o uso do elemento químico sendo divulgadas no Brasil. Desde a produção de hidrogênio verde e ônibus com células a hidrogênio rodando em universidades, recentemente foi noticiada a instalação de estações de reforma de etanol para produção do novo combustível em postos de combustíveis.
“O interesse em tecnologias de energia que não dependam de baterias de alta capacidade para garantir a autonomia vem crescendo nos últimos anos, nos transportes, equipamentos portáteis e aplicações de energia estacionária”, afirma Abreu, lembrando que entre as soluções limpas que ganharam grande atenção e investimento até o momento estão as células de combustível, capazes de produzir eletricidade a partir de hidrogênio com alto rendimento.
Desafios para transformar hidrogênio verde em realidade
Abreu explica que, como o hidrogênio verde eletrolítico ainda tem desafios a superar na sua produção, custo, transporte e armazenagem, várias novas tecnologias em desenvolvimento para a produção da solução a partir da reforma do etanol e de outros combustíveis, facilitarão a antecipação da “era do hidrogênio” na mobilidade. No uso estacionário, em que uma usina termoelétrica normalmente gera eletricidade com eficiências de 40% a 45%, sistemas de célula a combustível podem alcançar eficiências de 65%. Equipamentos estacionários já em fase comercial indicam eficiência combinada do sistema da ordem de 85%.
Abreu informa que células a combustível que operam diretamente com hidrogênio produzem eletricidade, tendo a água e o calor gerado no processo como os únicos subprodutos. Quando se produz hidrogênio através da reforma de combustíveis haverá a produção de CO2 e pequenas quantidades de outros subprodutos como o monóxido de carbono e gás metano, que serão oxidados a CO2 em um pós-queimador. Se o combustível for renovável, todo o CO2 produzido é reciclável e não é contabilizado como gás de efeito estufa.
O especialista esclarece também em artigo de sua autoria que, no uso veicular, a conversão da energia química do combustível em energia mecânica em motores de combustão é limitada pelas leis da termodinâmica, cujos extremos teóricos de rendimento estão bem abaixo dos que podem ser obtidos nas reações eletroquímicas das células a combustível:
“Protótipo veicular de um sistema de célula de combustível que teoricamente pode chegar a 92% da energia do combustível, na prática já atingiu 60%, que é uma redução importante do consumo energético em relação a um veículo convencional com um motor de combustão interna. Além disso, as células de combustível operam silenciosamente, possuem menos peças móveis, consequentemente com menor desgaste, e são adequadas para uma variedade de aplicações móveis como geradores de eletricidade auxiliares, desempenhando um papel importante papel na implementação generalizada de fontes de energia renováveis limpas e com isso reduzir o consumo dos fosseis na mobilidade de baixo carbono”.
Segundo Abreu, os tipos de células de combustível PEM (Proton Exchange Membrane) e SOFC (Solid Oxide Fuel Cell) são particularmente adequadas na aplicação de transportes, mas os veículos de células a combustível (FCVs) ainda necessitam de desenvolvimento.
Schaeffler é uma das empresas que apostam nas células a combustível
O foco tecnológico da Schaeffler, revelado durante a participação da empresa na IAA Transportation, o Salão de Hannover, maior feira global para o setor de transporte e logística para powertrains de veículos comerciais, realizada de 19 a 25 de setembro, também inclui o hidrogênio. A empresa anunciou que acredita que o setor de transporte de longa distância será o primeiro a adotar os propulsores por células de combustível. No entanto, vans também se beneficiam dessa tecnologia já que usualmente percorrem distâncias maiores de forma regular.
Na IAA Transportation, a Schaeffler apresentou uma van movida a célula de combustível: o eixo elétrico do veículo e as pilhas de células de combustível, bem como seu sistema de gerenciamento de energia, foram desenvolvidos internamente pela sistemista – processo que expandiu significativamente o conhecimento da companhia na tecnologia, aponta a empresa.
Além disso, estão em desenvolvimento tecnologias de motores para combustíveis alternativos, particularmente direcionadas à queima direta de hidrogênio em motores de combustão interna especialmente convertidos. Segundo informa a Schaeffler em comunicado à imprensa, o sistema de válvula variável permite um controle muito preciso do fluxo do ar, independentemente da mistura de combustível, garantindo assim maior eficiência.
Tupy faz parceria em motor a hidrogênio
A Tupy, multinacional brasileira do setor metalúrgico, anunciou recentemente que está trabalhando em parceria com a Westport Fuel Systems (líder global em combustíveis alternativos) e a AVL List (a maior empresa independente do mundo no desenvolvimento, simulação e teste na indústria automotiva), no desenvolvimento de um motor de combustão interna de alta eficiência, movido a hidrogênio e destinado ao uso no transporte de cargas.
De acordo com a Tupy, especialistas apostam no hidrogênio como alternativa de fonte de energia para aplicações no transporte de cargas, já que, além de ser neutro em carbono, o gás pode ser reabastecido rapidamente e ser usado para alimentar células de combustível e motores a combustão interna. Estes propulsores, aliás, ainda têm a vantagem de permitir o uso de bases tecnológicas já existentes, o que pode ser fundamental para garantir o seu custo acessível para caminhões e ônibus que rodam longas distâncias.
“O motor a hidrogênio é uma alternativa promissora de propulsão. Além de ser uma tecnologia carbono neutra, tem maior durabilidade, potencial para reabastecimento rápido e menor custo operacional. A Tupy quer aliar seu conhecimento técnico e as descobertas importantes de seu time de pesquisa e desenvolvimento (P&D) às visões de parceiros internacionais, a fim de fomentar o desenvolvimento da tecnologia adequada, em diferentes aplicações e regiões, para a transição energética” destaca André Ferrarese, diretor da Tupy Tech.
A Tupy também é associada à Associação Brasileira de Hidrogênio (ABH2) e apoia a entidade na promoção do desenvolvimento de estudos e pesquisas científicas, tecnológicas e inovadoras, com o objetivo de fortalecer a indústria de hidrogênio no Brasil.
Nissan desenvolve célula a hidrogênio combustível no Brasil
Rogério Louro, diretor de comunicação da Nissan no Brasil, afirmou a Automotive Business que em breve a empresa anunciará os avanços no desenvolvimento de células a combustível que a matriz da companhia promove em parceria com a operação brasileira. A Nissan testa no Japão dois furgões movidos a célula de combustível desenvolvidos no Brasil partir de veículos da marca 100% elétricos e-NV200 e agora conhecidos como protótipos SOFC – Solid Oxide Fuel Cell.
“O País foi o primeiro a ter testes com as duas unidades, antes mesmo do Japão” – disse a Automotive Business o gerente sênior de engenharia de produto da Nissan do Brasil, Ricardo Abe, que acompanha desde o início o projeto no Brasil. Ele enfatizou que terá “boas novidades” sobre o tema, o que sugere a participação do Brasil nas novas etapas desse empreendimento.
Segundo apurou Automotive Business, o projeto dos furgões teve forte atuação da equipe de pesquisa e desenvolvimento da Nissan do Brasil. O País tem papel importante no desenvolvimento dessa tecnologia de células de combustível com o emprego de etanol. O sistema SOFC veio do Japão, mas parte do desenvolvimento foi feita localmente. “Nossos técnicos acompanham de perto a performance dos dois furgões, que seguem em testes no Japão”, observa Abe.
O projeto dos furgões com o sistema SOFC tem a participação também do Ipen – Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares, da USP, e também já teve o apoio do Laboratório de Genômica e BioEnergia da Unicamp.
Iveco promoveu hidrogênio no Salão de Hannover
Durante o IAA, Bruno de Oliveira, repórter de Automotive Business, conheceu a Iveco eDaily, desenvolvida em parceria com a Hyundai e que leva em seu powertrain célula de combustível que converte hidrogênio em eletricidade. “Ainda que seja um protótipo de uma parceria que começou este ano entre as fabricantes, a expectativa é de que a demanda global por entregas de última milha seja um importante vetor de negócios envolvendo o veículo”, escreveu o jornalista.
Paulo Braga é jornalista, administrador de empresas e sócio-fundador de Automotive Business.
*Este texto traz a opinião do autor e não reflete, necessariamente, o posicionamento editorial de Automotive Business
Fonte: Automotive Business