Por Cibele Gandolpho
A OpenAI acaba de transformar o ChatGPT em uma vitrine de vendas. Com o lançamento do Instant Checkout, a ferramenta que até então servia apenas para conversar e pesquisar passa a permitir compras diretas de produtos dentro do chat. É um movimento que promete mexer com o varejo digital e abrir novas oportunidades de negócios para marcas e plataformas pelo mundo.
A novidade marca o início de uma fase em que o consumidor pode pedir recomendações, comparar opções e fechar a compra sem sair da conversa com a inteligência artificial — o chamado comércio conversacional. O recurso, lançado inicialmente nos Estados Unidos, começa com produtos da Etsy (marketplace global focado em itens personalizados) e será ampliado para mais de um milhão de lojistas que utilizam o Shopify (plataforma de e-commerce), em parceria com a empresa de pagamentos Stripe. Ainda não há previsão para estrear no Brasil.
Na prática, o ChatGPT atua como uma espécie de personal shopper digital, conectando usuários e comerciantes de forma automática. Ao digitar algo como “fones de ouvido bluetooth de boa qualidade por US$ 50”, o usuário encontra sugestões de produtos e consegue concluir a compra diretamente na conversa, sem abrir novas páginas ou preencher cadastros. Toda a transação ocorre dentro do ambiente do vendedor, que segue responsável pelo envio e pelo atendimento.
Além de simplificar a jornada do consumidor, a OpenAI abre uma nova frente de monetização. Embora as compras não tenham custo adicional para o usuário, os lojistas pagam uma taxa sobre as vendas feitas dentro do ChatGPT. A empresa afirma que os resultados de busca continuam orgânicos, mas admite que fatores como preço e disponibilidade podem influenciar a exibição dos produtos — o que tende a gerar uma nova disputa por visibilidade dentro da plataforma.
O Instant Checkout inaugura um campo de oportunidades: estar presente em interfaces de IA pode se tornar tão importante quanto ter um site bem ranqueado no Google. No futuro, ser recomendado por um chatbot pode equivaler a aparecer na vitrine de uma grande plataforma de e-commerce.
Impacto comercial
Para Edson Germano, professor da FIA Business School, a chegada do Instant Checkout representa um marco na integração entre busca, recomendação e compra. “Cada vez mais as pessoas usam a IA generativa para fazer pesquisas e obter respostas que antes buscavam no Google. Se o consumidor já está recorrendo à IA para encontrar soluções, faz sentido permitir que ele conclua a compra dentro do mesmo ambiente”, explica.
Segundo Germano, o Instant Checkout nasceu para reduzir a fricção na jornada de compra ao unir descoberta, recomendação e pagamento dentro da mesma conversa — o que tende a elevar as taxas de conversão e acelerar decisões, especialmente em compras de baixo ou médio valor ou rotineiras.
Ele pondera, no entanto, que a adoção no Brasil deve ser gradual. “Dependerá de fatores locais como meios de pagamento, logística, confiança e regulação – o que pode fazer com que a penetração comece pelos grandes centros e categorias menos complexas.”
O ChatGPT deixa de ser apenas um canal de descoberta para se tornar um ambiente híbrido de varejo. “É um modelo conversacional e multimodal, capaz de executar transações e conectar consumidores, agentes de IA e múltiplos lojistas em fluxos automatizados. O papel da IA muda: de assistente informativo para curador e executor de compras”, diz o professor da FIA.
As empresas que quiserem vender dentro de assistentes de IA precisarão se preparar com base técnica e estratégica. Será essencial estruturar catálogos com metadados e disponibilidade em tempo real, integrar pagamentos compatíveis, garantir excelência em logística e pós-venda e trabalhar sinais de confiança, como avaliações e políticas claras.
Para Germano, o varejo nacional precisa repensar suas estratégias digitais diante dessa nova camada de inteligência. “As empresas devem incluir esse canal no funil digital, investir em integração omnicanal, qualidade de dados, APIs e governança de privacidade. Também precisam mapear modelos de monetização e criar planos de contingência caso as regras de funcionamento das plataformas mudem.”
Varejo inteligente
Nesse mesmo sentido, Eduardo Yamashita, diretor de Operações da Gouvêa Ecosystem, observa que o avanço do Instant Checkout ocorre em meio a uma transformação mais ampla, impulsionada pela integração de múltiplas ferramentas de inteligência artificial no varejo.
“Temos visto cada vez mais o uso dessas ferramentas nas operações de varejistas em todo o mundo — e também no Brasil — para otimizar processos e oferecer uma experiência ultracustomizada ao consumidor.”
Segundo ele, há uma tendência global de adoção de módulos de IA cada vez mais especializados, voltados a resolver problemas específicos. Em vez de um único motor generalista que faz tudo, as empresas estão implementando diversas soluções menores e dedicadas, que depois precisam ser orquestradas.
Essa fragmentação amplia o potencial de personalização e redefine a jornada do cliente. “Com essas ferramentas, cada elemento da experiência pode ser adaptado: recomendações, descrições, fotos, vídeos e até reviews passam a ser selecionados pessoa a pessoa. É uma hiperpersonalização inalcançável antes da IA”, diz.
Yamashita observa que o movimento tende a se intensificar também no Brasil. “Além de comprar dentro do ChatGPT, veremos o movimento inverso: varejistas integrando esse tipo de tecnologia em seus próprios assistentes conversacionais, como WhatsApp e Instagram. “Esses canais já são preferidos pelos brasileiros para interagir com marcas — e, cada vez mais, para comprar produtos e serviços.”
Neste contexto, o mercado nacional precisa acompanhar esse avanço com experimentação e adaptação. Empresas maiores, mais estruturadas e com forte orientação digital estão testando as ferramentas rapidamente e integrando-as em seus canais.
“Por outro lado, há uma democratização inédita do acesso a essas tecnologias. Antes, apenas grandes empresas conseguiam investir em licenças e integrações. Agora, os fornecedores estão abrindo o uso para que pequenos e médios negócios também possam aproveitar os benefícios. É uma oportunidade para que todos os tamanhos de varejo avancem juntos nessa transformação”, conclui.
Experiência do cliente
A entrada da OpenAI nesse campo muda a lógica do comércio digital. Para Gilsinei Hansen, CRO da Zenvia – empresa especializada em automação e comunicação para o varejo, o ChatGPT vai ocupar um espaço relevante. “Definitivamente, será um dos marketplaces com maior tráfego e precisará estar no topo das prioridades de quem vende produtos e serviços online”, afirma.
Hansen lembra que o conceito de comércio conversacional (c-commerce) não é novo, mas ganha força com a popularização das IAs generativas. “Na NRF de 2017, já se falava em conversas que viravam vendas. Agora, com o ChatGPT e o WhatsApp, o e-commerce como conhecemos está mudando rapidamente. Provavelmente, veremos os marketplaces tradicionais rivalizando com as plataformas conversacionais.”
O grande desafio para as empresas será transformar conversas em conversão. “As primeiras a adotar o Instant Checkout devem ser grandes varejistas e marcas globais, por conta da complexidade técnica e da integração com o protocolo da OpenAI. Mas os pequenos negócios digitais têm mais agilidade e podem se beneficiar com plataformas como Stripe e Shopify”, avalia Hansen.
O comércio conversacional tende a ganhar protagonismo nos próximos anos. É difícil projetar cinco anos, mas o ChatGPT, o Gemini e o WhatsApp devem ser protagonistas na jornada de consumo já nos próximos meses. “O varejo precisa se preparar agora para isso”, afirma o executivo.
Relevância
Segundo a OpenAI, o ChatGPT recebe 2,5 bilhões de solicitações de usuários globais todos os dias (os prompts). Uma pesquisa global da agência VML mostra que 68% dos consumidores já usaram alguma forma de IA, e 5% recorreram a essas plataformas para buscar informações sobre produtos. A tendência, agora, é que essa busca evolua para a compra direta — o que coloca o ChatGPT em rota de colisão com grandes marketplaces e buscadores tradicionais.
Para as marcas, o desafio será entender como se posicionar nesse novo cenário. Estratégias como o Generative Engine Optimization (GEO), voltadas à visibilidade em mecanismos de IA, devem ganhar força. Autenticidade, reputação e presença digital sólida se tornam fundamentais para conquistar relevância nas respostas geradas por inteligência artificial.
Fonte: Diário do Comércio – Imagem: Gerada por IA (https://dcomercio.com.br/publicacao/s/chatgpt-lanca-botao-de-compra-e-transforma-ia-em-nova-vitrine-digital)






















