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Atuação D2C ainda é exceção no Brasil e no mundo

Um survey realizado pela KPMG que ouviu 100 executivos de grandes empresas de diversos setores, incluindo dois do mercado automotivo, mostrou que, apesar do interesse crescente das marcas em explorar canais diretos ao consumidor (D2C), há uma série de barreiras estruturais

01/09/2025

Por Christiane Benassi

Com o aumento de lojas oficiais das indústrias autopeças em marketplaces, como Shopee, crescem os temores da quebra na cadeia de distribuição. No entanto, o cenário prático e estudos conduzidos por organizações respeitadas mostram que essa ruptura ainda está distante.

Um survey realizado pela KPMG que ouviu 100 executivos de grandes empresas de diversos setores, incluindo dois do mercado automotivo, mostrou que, apesar do interesse crescente das marcas em explorar canais diretos ao consumidor (D2C), há uma série de barreiras estruturais que tornam o movimento desafiador, especialmente em setores com operações complexas e cadeias tradicionais consolidadas.

De acordo com os respondentes, os principais entraves incluem o alto custo de marketing necessário para atrair tráfego qualificado, a dificuldade em montar operações robustas de atendimento ao consumidor e os desafios logísticos relacionados à ‘última milha’, devoluções e trocas. Em outras palavras: vender direto é mais do que abrir um site, exige estrutura, investimento e competências que muitas indústrias ainda estão longe de dominar.

Essa visão é corroborada por análises do Boston Consulting Group (BCG), que vêm apontando há anos que, no Aftermarket Automotivo, a venda direta pura esbarra em questões técnicas, operacionais e estratégicas. A consultoria destaca, por exemplo, que marcas que buscam o modelo D2C enfrentam não só o risco de canibalizar seus canais de distribuição parceiros, como também precisam desenvolver capacidades digitais profundas, como CRM, campanhas personalizadas, SAC 24/7 e estratégias de retenção, geralmente inexistentes em indústrias focadas tradicionalmente em B2B.

Vendas D2C respondem por apenas 5% do total comercializado pelo Brasil. Nos Estados Unidos, este número chega a 15%

Além disso, o BCG argumenta que o consumidor médio de peças automotivas ainda vê no varejista ou no mecânico um ator de confiança e consultoria técnica, o que limita a efetividade de abordagens diretas sem intermediação. O resultado é que muitas empresas, ainda que desejem aumentar sua proximidade com o consumidor final, optam por modelos híbridos, como as lojas oficiais em marketplaces operadas por parceiros certificados. Esse arranjo oferece a vantagem de estar presente em canais digitais com alto tráfego, como a Shopee ou o Mercado Livre, sem arcar com os custos e riscos de um D2C 100% proprietário.

Os números confirmam esse cenário. Segundo dados da eMarketer, apenas 5% das vendas online no Brasil acontecem via canais diretos da indústria. Nos Estados Unidos, onde o ecossistema logístico e digital é mais amadurecido, esse percentual chega a 15%, ainda assim longe de representar uma disrupção da cadeia tradicional.

Vendas digitais são realidade, mas articulação junto aos reparadores ainda é barreira

A ênfase dada pela Shopee ao mercado de autopeças está longe de ser um movimento isolado. A consolidação do ambiente digital como canal estratégico para o aftermarket é um processo em curso, e os números ajudam a dimensionar a força dessa tendência.

De acordo com o Mercado Livre, por exemplo, as autopeças representam 13% do total de seu faturamento no Brasil, sendo este um dos segmentos mais estratégicos para a companhia em toda a América Latina.

Para Fernanda Giacon, Gerente Sênior de Comunicação, Excelência Comercial, Clientes e Estratégia da ZF América do Sul, o avanço do conceito de marketplace é consistente e deve se intensificar. “Quando a gente olha o nosso mercado e compara com os outros que estão um pouquinho à frente do Brasil na digitalização, eu acho que todo mundo tem certeza que vai crescer. Não tem nenhuma perspectiva de que esse modelo de negócio não seja o que os consumidores estão buscando hoje”.

Ainda assim, o caminho até uma digitalização ainda mais significativa da venda de autopeças de reposição passa por um gargalo importante: o relacionamento com os reparadores. Isso porque, os marketplaces ainda enfrentam dificuldades para atender plenamente o canal B2B.

A Shopee, por exemplo, realiza vendas apenas para CPFs, o que limita sua penetração direta junto às oficinas. Já o Mercado Livre, embora atue com CNPJs, reconhece que ainda há espaço para crescer junto a esse público.

“A verdade é que eles seguem sendo minoria, já que representam apenas 2,7% do total de compradores da categoria. Ainda assim, o fato do ticket médio deste público ser mais alto faz com que a parcela de compras realizadas pelos reparadores seja algo relevante – correspondendo por 27% do faturamento total do segmento de autopeças”, afirmou o responsável pelo Aftermarket Automotivo do Mercado Livre na Argentina – antes de complementar: “Queremos avançar ainda mais, por isso estamos investindo na nossa unidade de mercado chamada ‘Venda B2B’, na qual estamos analisando o que temos de melhorar internamente para tornar ainda mais atrativa a experiência de consumo dessas pessoas que compram por volume”.

Segundo Fernanda Giacon, essa dificuldade de modificar os hábitos de compra dos reparadores pode estar com os dias contados. Ela destaca que, com o aumento da complexidade dos sistemas veiculares, os próprios profissionais da reparação têm buscado mais agilidade, confiabilidade e eficiência nas compras de peças. Nesse contexto, os marketplaces tendem a ganhar espaço. O desafio, no entanto, é adaptar a experiência de compra às particularidades do setor.

A executiva lembra que a maior parte dos reparadores ainda recorre a práticas manuais, como o envio de mensagens por WhatsApp para diferentes varejistas com quem já têm relação, um modelo que, para ela, está em claro processo de obsolescência. “Ele vai recebendo essas cotações ali ao longo de algumas horas. Quando consegue toda a disponibilidade das peças que precisa e os preços, ele decide se vai comprar tudo num lugar só ou se vai pedir em mais de um lugar. Então é bem ineficiente ainda a forma como as oficinas fazem a compra das peças. A popularização e o aprimoramento dos marketplaces ajudam a dar mais eficiência para essas compras”, decreta Fernanda Giacon.

Dados do Mercado Livre mostram que reparador segue sendo o principal comprador de autopeças

  • o volume de itens pedidos nas vendas B2B é, em média, 4 vezes maior.
  • o ticket médio das vendas B2B é cerca de 33% maior em relação às negociações B2C.

Fonte: Novo Varejo

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