“Qualquer associação de classe será tão forte quanto os seus membros queiram fazê-la.”

Montadoras e autopeças enxergam desafios econômicos em 2026

Presidentes da Anfavea, Igor Calvet, e do Sindipeças, Cláudio Sahad, participaram do Congresso AutoData Perspectivas e Tendências 2026

12/11/2025

Fotos: Bruna Nishihata

Por Lucia Camargo Nunes

Desafios econômicos são obstáculos da indústria automotiva no ano que vem. No painel que abriu o Congresso AutoData Perspectivas e Tendências 2026, na terça-feira, 11, Igor Calvet, presidente executivo da Anfavea, e Cláudio Sahad, presidente do Sindipeças, apresentaram um panorama que equilibra preocupações imediatas com oportunidades estratégicas.

A taxa de juros será, mais uma vez, o principal obstáculo para o crescimento do setor em 2026, na opinião dos dirigentes. Embora se projete uma flexibilização monetária gradual no primeiro trimestre, com quedas iniciais de 0,25 ponto porcentual, a Selic deverá permanecer elevada, possivelmente em torno de 13% a 14%. Segundo Sahad, do Sindipeças, o cenário é negativo porque além de prejudicar o mercado uma taxa alta interfere nos investimentos.

De toda forma os investimentos já anunciados, superiores a R$ 140 bilhões, seguem: “A pergunta não é quando esses investimentos deslancharão”, disse Calvet. “É até quando nós teremos os investimentos vigentes”.

Os investimentos atuais, segundo o presidente executivo da Anfavea, são em renovação de portfólio de produtos e novas tecnologias para transição energética, não em aumento da capacidade produtiva, pois existe ociosidade. Que é agravada com a chegada de montadoras com origem na China.

A vinda de novos competidores, porém, não é vista com maus olhos. Mas Sahad foi direto ao estabelecer os critérios de boas-vindas: “Empresas, não só chinesas, estrangeiras, que venham para o Brasil, que queiram produzir aqui, utilizando a cadeia de fornecimento brasileira, são sempre bem-vindas. Empresas que queiram vir para cá para importar, fazer CKD, nós repudiamos”.

Calvet reforçou a importância da produção local: “Eu defendo a produção no País. Eu sou presidente da associação dos fabricantes, não dos importadores, e neste momento da nossa história o que tem sido visto é um processo robusto de importações sem contrapartida em produção. É contra isto, e não sobre a origem deste capital, que eu tenho lutado nos últimos meses”.

Igor Calvet

Para as montadoras com origem na China o desafio é diferente do que enfrentam em seu mercado doméstico. Na China estas empresas são altamente verticalizadas devido aos volumes massivos de produção. No Brasil, com volumes menores, a verticalização será inviável, forçando-as a desenvolver fornecedores locais se quiserem produzir sem depender de importações.

Calvet reforçou a importância em produzir localmente, investir em P&D e praticar a isonomia, garantindo que não haja tratamento preferencial ou facilidades que prejudiquem os investimentos das empresas já instaladas no País: “Se estamos diante de um novo momento da nossa indústria, de um novo ciclo industrial, é necessário garantir que seja um ciclo de industrialização e não apenas de substituição de importação por montagem”.

Batalha pelos ex-tarifários

Uma frente crucial de atuação do Sindipeças, com apoio da Anfavea, é a revisão das regras de concessão de ex-tarifários. Atualmente, há mais de 9 mil itens passando por vantagens fiscais, muitas vezes de forma problemática.

O principal ponto de preocupação é que ex-tarifários estão sendo concedidos para conjuntos completos de componentes, mesmo quando apenas alguns itens não possuem similar nacional, permitindo que peças que poderiam ser produzidas localmente sejam importadas com benefícios fiscais.

Outro ponto crítico são os prazos indefinidos, afirmou Sahad: “Os ex-tarifários têm que ter um prazo de validade. Alguns foram concedidos há décadas. Que estímulo vai dar para desenvolver um fornecedor local? Zero”.

Cláudio Sahad

Um terceiro problema é a falta de uniformidade, com concessões para uma empresa de forma diferente para outras. Sahad enfatizou que o MDIC tem demonstrado receptividade a essas propostas, que visam a incentivar o desenvolvimento da cadeia local.

Estratégia para atrair tecnologia global

Sahad esteve recentemente no Japão com fabricantes de autopeças tier 2 e tier 3 com proposta para que se use o Brasil como base de produção para aproveitar a matriz energética limpa, reduzir emissões de carbono e ganhar competitividade para exportação. A proposta envolve joint ventures que tragam tecnologia estrangeira para empresas locais já estabelecidas, reduzindo riscos e acelerando o upgrade tecnológico.

“Eles não têm que construir e se adaptar às regras do país, à cultura, desenvolver cadeia de clientes. Isso já está lá. Eles têm que levar tecnologia, máquinas, processos e algumas pessoas para gerenciar isto.”

Do lado brasileiro as empresas terão um upgrade tecnológico com muito mais rapidez e um custo menor: “As montadoras poderão nacionalizar componentes que hoje elas importam e aumentar o índice de localização”.

A pegada de carbono emerge como fator decisivo e competitivo, com a possibilidade de atrair empresas do mundo inteiro.

Brasil na vanguarda da descarbonização

Na opinião dos executivos o Brasil emerge como um dos países com maior previsibilidade em transição energética automotiva. Calvet destacou essa inversão: “O Brasil sempre foi visto como um país da imprevisibilidade, da instabilidade. Hoje no mundo, talvez, seja o mais previsível e o mais estável.”

Sahad reforçou esta percepção, destacando que hoje o Brasil tem muito mais previsibilidade com relação a tendências tecnológicas de eletrificação do que na Europa e nos Estados Unidos. “O [presidente dos Estados Unidos Donald] Trump começou a mudar todo o regramento de elétricos. Na Europa eles não sabem se continuarão, de fato, com elétricos, se vão para combustão, se ficam nos híbridos. Uma dúvida total”.

O Brasil também possui a menor pegada de carbono do setor automotivo global, Calvet lembrou mais uma vez: “Conseguimos fabricar, veículos e autopeças, com a menor pegada de carbono. Temos uma matriz elétrica 90% renovável e uma matriz energética 50% renovável. Quando vamos para o uso do veículo, que é o nosso produto, seja ele um veículo leve ou pesado, o consumo também é menos intensivo em emissões de CO2 do que no resto do mundo”.

Fonte: AutoData

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