Por Soraia Abreu Pedrozo
A lei 12 977, a Lei do Desmanche, entrou em vigor em 2014 com o objetivo de regulamentar a atividade de desmontagem de veículos. E, de fato, foi divisor de águas para que o setor de reciclagem automotiva pudesse dar seus primeiros passos. Hoje, segundo dados da ABCAR, Associação Brasileira de Reciclagem Automotiva, este mercado movimenta R$ 2 bilhões por ano com a reciclagem de 550 mil unidades. Há, no entanto, potencial para dobrar tanto a cifra quanto a quantidade, a depender do avanço da legislação.
“Somos recém-nascidos. Antes trabalhávamos de forma amadora, sem regras nem compromissos com o meio ambiente e fiscal”, afirmou Júlio Luchesi, presidente da ABCAR, à Agência AutoData. Um dos fatores que seguram os números é o fato de que, ao longo de onze anos, apenas os estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul disciplinaram seus Detran, Departamentos Estaduais de Trânsito, e adequaram-se à norma, que inclui a rastreabilidade das peças por meio de etiquetas realizada pelo governo ou por empresa privada contratada. Custoso, portanto.
“Embora a regra seja complicada, estados que aderiram tiveram grande avanço no setor, antes considerado como criminoso e fomentador de furto e roubo de carros. Somente em São Paulo houve redução de 50% na estatística desde então, porque as empresas legais vêm combatendo as irregularidades.”
Dificuldade enfrentada pela atividade nas localidades em que já é regulamentada é a oferta de veículos, ressaltou Luchesi. A estimativa é de que existam 2 milhões de veículos no fim da vida útil todos os anos e, no entanto, apenas um quarto disto é reciclado.
Há, segundo ele, três formas de se obter veículos para serem desmontados e reciclados: uma delas por meio do proprietário que teve o carro colidido e solicita sua baixa permanente, outra por leilões públicos, promovidos pelos Detran e polícias rodoviárias, e privados, em que locadoras e seguradoras encaminham veículos com perda total – e que também têm se movimentado na reciclagem.
Somente São Paulo oferece a este mercado 250 mil veículos por ano, 45% do total no Brasil. Outros 300 mil veículos, que totalizam 550 mil, são reciclados por ano da forma correta, ressaltou o especialista, ao reforçar que o potencial é de chegar a pelo menos 1 milhão por ano.
Justamente o perfil que gera a maior oferta atualmente, de veículos menores e mais acessíveis, encontra fator que dificulta sua expansão: “Hoje a reciclagem de veículos de pequeno valor é inviabilizada. A baixa do veículo muitas vezes é impedida por débitos de impostos e multas, razão de tantos veículos abandonados”.

Luchesi lembrou que, à época de sua criação, a lei foi pensada como uma questão de segurança pública, mas que deveria ser atualizada ou complementada por legislação dedicada ao tema ambiental para incentivar a reciclagem e incluir o restante do Brasil.
Estados como Rio Grande do Sul e Minas Gerais têm feito a desvinculação do veículo e transferido a dívida para o CPF do proprietário, que será inserido no Cadin, Cadastro Informativo de Inadimplência, contou. São Paulo está em trâmites para aprovar esta regra: “Mas, se houvesse lei federal que determinasse isto, seria mais fácil. O código de trânsito brasileiro é muito antigo”.
País conta com 5 mil centros de desmontagem, a maioria pequenas empresas
Existem hoje em torno de 5 mil CDVs, Centros de Desmontagem Veicular, no País, sendo 1,2 mil somente em São Paulo, credenciados pelo Detran. Antigamente conhecidos por ferros-velhos, hoje são empresas que têm engenheiros técnicos responsáveis e classificam as peças em três tipos: a que pode ser comercializada na íntegra, a que necessita de reparo e aquela que vai para a reciclagem por não poder ser reaproveitada.
O produto principal no mercado de reciclagem são estruturas metálicas e o restante é descartado no aterro sanitário. Quando se fala em desmontagem amplia-se o espectro com o aproveitamento de plásticos, vidros, tecidos e estofamentos. Assim, crescem a arrecadação de impostos e a oferta de peças originais.
A maior parte dos CDVs é de micro, pequenas e médias empresas e, na avaliação do presidente da ABCAR, o avanço do Mover e da reciclabilidade traz empresas maiores, que negociam melhor os benefícios com o governo: “Nos Estados Unidos, para se ter ideia, há até empresas de capital aberto e, por ano, o setor movimenta US$ 40 bilhões”.
Outro ponto que ajudará a impulsionar a atividade no Brasil é a adoção do programa de renovação de frota, que inseriria melhor veículos pesados. Do total de veículos desmontados 70% são de pequeno porte, principalmente carros.
Segundo o especialista há poucos CDVs que fazem a reciclagem de caminhões, o que mudaria com um programa de renovação: “Teria de existir incentivo tributário. Se isto não for colocado como lei teremos caminhões com sessenta anos de uso rodando cada vez com mais frequência.”
Fonte: AutoData