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5º Encontro da Indústria de Autopeças traz à tona temas relevantes do momento

Os participantes puderam conferir as expectativas com o programa Mover, o processo de desglobalização e internalização produtiva, e como a inteligência artificial generativa tem sido aplicada no mundo dos negócios

28/04/2025

Por Karin Fuchs

O 5º Encontro da Indústria de Autopeças, realizado no dia 24 de abril na Automec, abordou os temas atuais mais relevantes que impactam toda a cadeia de suprimentos das montadoras e, consequentemente, o mercado de reposição: O fim de uma era de globalização e o incentivo à produção local, o programa Mover e o uso da inteligência artificial no mercado corporativo. Claudio Saad, presidente da Abipeças e do Sindipeças fez a abertura, chamando ao palco Dan Ioschpe, vice-presidente da Fiesp e membro do Conselho de Administração do Sindipeças.

Escolhido pelo governo Lula para ser o High Level Champion da COP30 em Belém (PA), Ioschpe apresentou a palestra magna “Internacionalização, Reshoring e Sustentabilidade”, mostrando os caminhos para as empresas se internacionalizarem, o fim de uma era de globalização e a sustentabilidade como estratégia competitiva. “As vantagens da internacionalização são a redução de riscos associados a uma região, a melhora da proposta de valor oferecida aos clientes (global footprint) e o aproveitamento de vantagens competitivas da localização”. Ele disse também que a presença global com ativos é uma grande fortaleza para aumentar a vantagem competitiva e reduzir a competitividade do concorrente. Por outro lado, “a desvantagem da internacionalização é o aumento do capital investido”, afirmou.

Sobre a globalização, a partir do final da década de 1980 com a produção concentrada na Ásia e na década seguinte, na China, Ioschpe explicou que ela foi determinante para incluir centenas de milhares de pessoas no mercado de consumo e o melhor inimigo da inflação, uma vez que o comprador escolhe o país de origem (oferta e demanda). No setor automotivo, ele destacou a China, que nos anos de 1990 tinha uma produção praticamente nula de veículos automotivos e agora produz mais de 30 milhões de unidades anuais, com avanço tecnológico e mercadológico.

As mudanças a partir da pandemia de covid-19

A grande mudança, disse Ioschpe, veio com a pandemia de covid-19 e a ideia do reshoring é essencialmente acabar com a concentração para diminuir o risco. “A globalização pós-covid trouxe de volta políticas industriais com muito vigor, incentivos à localização e a revisão de itens essenciais, dois deles muito evidentes, baterias e semicondutores. Um período de reativação da cadeia de valor e de reaproximação das cadeias próximas a grandes mercados, como o México vizinho dos Estados Unidos. No nosso setor eles já andavam nesse caminho ao longo do tempo, tanto que o México já produzia quase três vezes o volume de veículos consumidos no mercado doméstico com a proposta de exportá-los para os Estados Unidos”, explicou.

Quanto ao Brasil, em comparação ao México, Ioschpe ilustrou o quando deixamos de ser competitivos. “O Brasil estava muito à frente do México em termos de profundidade de suas cadeias de valor (siderurgia, alumínio, borracha, entre outros). A partir dos anos de 1970 tivemos essa profundidade. Infelizmente, não conseguimos fazê-la ficar competitiva a partir de determinado momento”.

Agora, o momento é de transição para o protecionismo. “A localização agressiva passa a ser o objetivo, IRA (Inflation Reduction Act, uma lei americana que oferece incentivos fiscais), outros estímulos fiscais e políticas tarifárias. Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação, PD&I, é o incentivo para trazer a localização ao invés de impor a produção local. Estamos nesse caminho e o Mover vai nesta direção”, analisou Ioschpe.

Um caminho em que a sustentabilidade é estratégica para viabilizar a continuidade e o crescimento das empresas, conforme expôs o executivo. “A cadeia de valor buscará a sustentabilidade em seus processos produtivos e a demanda buscará alternativas sustentáveis. Sustentabilidade é a chave na oferta e na demanda”, declarou.

Um ano de Mover

No painel “Um ano de Mover”, o palestrante Evandro Maggio, presidente da Toyota do Brasil, falou sobre os avanços do programa Mover e a necessidade de previsibilidade para a indústria, com normas claras e estabilidade de critérios em longo prazo. “O Mover é uma oportunidade concreta para fomentar a inovação, a sustentabilidade e a competitividade do mercado nacional. Principalmente, em um ambiente onde a descarbonização é o vetor diferencial. Mais de 80% da matriz energética do Brasil é renovável, saltando aos olhos do mundo com o biocombustível como uma alternativa que pode ser expandida com valor agregado mundial”, afirmou.

Na visão de Maggio, houve muito entendimento na criação do programa sobre como medir a descarbonização, com o conceito ‘do poço à roda’, que mede a eficiência ambiental do combustível, com múltiplos caminhos, incluindo a valorização da tecnologia híbrida flex desenvolvida no Brasil. “O Mover abre o reconhecimento do biocombustível, da tecnologia híbrida, da tecnologia flex, e isso vem fomentando novas tecnologias e desenvolvimento, gerando contribuição na cadeia automotivo e na renda, não só do setor automotivo, mas do setor sucroalcooleiro também. Em média, o aumento do PIB nas cidades próximas às instalações de usinas de álcool chega a US$ 1 mil per capita”.

O executivo da Toyota também falou sobre o aumento da busca da competitividade através dos incentivos garantidos, a reciclabilidade pelo programa Mover, mas também colocou pontos de atenção. “Temos que trabalhar para que a normatização tenha muita clareza e estabilidade de critério ao longo do tempo, uma vez estabelecida, que tenha perenidade, pois o ciclo de desenvolvimento da indústria é muito longo”, explicou.

Outro ponto que merece atenção, segundo ele, é a agilidade nos processos. “A indústria é capital intensivo, o custo de capital é associado às taxas de juros do mercado. É preciso agilidade para que entre no fluxo de caixa das empresas e reduza a dependência de capitação externa. Ao mesmo tempo em que celebramos os avanços, é importante que a implementação seja harmônica entre os diversos órgãos do Governo e a administração pública para que ele tenha velocidade e um ambiente de segurança regulatória”, defendeu, incluindo o ajuste fiscal, de forma a preservar os objetivos técnicos do programa Mover.

Conduzido por Gábor Deák, diretor de Tecnologia e Sustentabilidade do Sindipeças, participaram também deste painel, Gastón Diaz Perez, CEO e presidente da Robert Bosch América Latina, Henry Joseph Jr., diretor Técnico e líder da Comissão de Energia e Meio Ambiente da Anfavea e Alexandre Tuzzi, presidente da Tuzzi Sistemas Automotivos.

Falta de metas bonificatórias

Henry Joseph Jr. elogiou o programa, principalmente, pelo incentivo a investimentos em pesquisa e desenvolvimento no Brasil de longo prazo, o que segundo ele, ficou perdido no programa Rota 30. A surpresa foi a falta das metas de bonificatórias no decreto publicado no dia 15 de abril. “Para os produtos que ultrapassassem as metas obrigatórias havia um desconto tributário. Isso não está no decreto e não sabemos como ficará. É um ponto importante, graças às metas bonificatórias, as empresas têm um seguro a mais para terem produtos cada vez melhores e competitivos no mercado frente à concorrência”, defendeu.

Gastón Diaz Perez chamou a atenção para um mercado potencial. “A tecnologia está se tornando a base dos veículos modernos com software desempenhando um papel crucial. O mercado de software se tornará maior que o de peças, essa discussão tem que começar aqui. Na Bosch, estamos investindo em pessoas, desenvolvendo o programa Academia de Talentos Digital, formando 300 jovens por ano e vamos formar nos próximos anos 1.000 desenvolvedores de software”.

Perez também defendeu a importância de regras claras e transparentes no Mover para não haver erros de interpretação e sobre a neutralidade tecnológica, como o melhor caminho para cumprir as metas. “É preciso evitar cometer erros que vimos nos outros países, onde os estados definiram as metas. O Governo tem que definir como e com qual tecnologia, e isso se dá com pesquisa e desenvolvimento, validada também pelo consumidor”, afirmou.  

A relevância das pequenas e médias empresas para os sistemistas e montadoras foi posta por Alexandre Tuzzi. Nos últimos dois anos, ele contou que foram mais de R$ 3 milhões investidos em projetos de inovação na sua empresa de médio porte. “Somos reconhecidos porque temos tecnologia para ofertar. Isso só é possível se tivermos programas do Governo suportando. Prover é muito importante, pesquisas são fundamentais, mas jamais podemos deixar as empresas de pequeno e médio portes de fora. Somos importantes para suportarmos os grandes desenvolvimentos. Uma indústria de base fraca jamais conseguirá suportar a evolução dos sistemistas e das montadoras”, enfatizou.

Uso eficaz da inteligência artificial

No segundo painel, “Uso eficaz da inteligência artificial”, participaram Ricardo Ávila, diretor de Operações da Sabó, Gustavo Bastos, presidente de Plataforma da Totvs, e Giuliano Eichmann, diretor de Operações da Horse. Mediado por Ricardo Terra, diretor do Senai, eles contaram como a IA tem sido aplicada no mundo corporativo e os cuidados no uso de dados.

Eichmann relatou que na Horse, a inteligência artificial já é utilizada há mais de dez anos na geração de dados e, principalmente, na confiabilidade de dados. “Com a geração de dados, vimos muitas oportunidades. Estimamos que hoje, 50% do que conseguimos na redução de consumo vêm dessa tecnologia. Além disso, temos também o desenvolvimento de motores e a inteligência artificial tem nos ajudado a reduzir significativamente o número de protótipos e o tempo de desenvolvimento de novos motores”, especificou.

Na visão de Ávila, o grande impacto da IA é a potencialização de oportunidades em alinhamento com as discussões de sustentabilidade e de ESG. “O primeiro impacto é na eficiência energética, como a redução de ar comprimido demandado nas operações, a redução da conta de energia elétrica e da água. A alta potencialização de correção das máquinas, evoluindo na indústria 4.0. O alvo está no autoajuste. O que está crescendo demais é a questão de dados, eles estão sendo formatados, trazendo inovações, mas cuidando para que eles sejam tratados com propósito”, afirmou.

Bastos comentou que iniciativas relacionadas à inteligência artificial já estão na indústria há bastante tempo e o que chama atenção mais recentemente é a IA generativa. “Ela pode abrir fronteiras para mais autonomia, mais decisão. Não é simplesmente uma automação, mas processos decisórios sendo possíveis sem intervenção de um ser humano. Enxergamos muitas coisas otimistas implementadas nos nossos processos e nos nossos produtos para os nossos clientes. Por outro lado, tem um cuidado muito grande. Quanto mais crítico o processo, mais criterioso nós somos com a adoção da tecnologia”, pontou. 

Ele também chamou a atenção para a necessidade de uma governança robusta nas empresas para entender qual é a finalidade do uso da IA generativa. “É preciso deixar claro qual é a política para as pessoas da empresa. Tem que ter um time focado em entender a adoção e ter claro o quanto a inovação é importante”, especificou. Além de cuidado e gestão adequada de dados, uma vez que muitas dessas informações podem ser segredos industriais e questões importantes dos negócios.

Fonte: Move News

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